Breves Percepções Sobre o Tratar
Quando os pacientes saem para as atividades externas em grupo com a equipe terapêutica, noto que eles ficam contentes, sorridentes, com semblantes radiantes, todos bem vestidos e sempre com comportamentos irrepreensíveis, digno de nota. Se não soubéssemos que estão todos em tratamento na área de saúde mental, passaria batido como qualquer grupo de pessoas “comuns”.
Lembrando dessas ocasiões, comecei a pensar em como fazê-los refletir e valorizar esses momentos. Dar enfoque a essa faceta, dessas pessoas, pois essas sim são elas de verdade. Como seres humanos que somos, no bojo da vida também existem os momentos e situações difíceis, onde cada um tem de superar da melhor forma seus problemas, dificuldades, patologias, crises.
- Por que não ser visto como alguém educado, ao invés de rebelde sem causa?
- Por que não ser visto pelas coisas boas que faz, ao invés do que deixa a desejar?
- Por que não ser visto pelo esforço da mudança, ao invés da fraqueza?
- Por que não ser notado pela participação ativa nas atividades da vida, ao invés do ser faltoso e negligente?
- Por que não ser visto como organizado, ao invés de desleixado?
- Por que não ser visto como alguém que ama e se preocupa com a família, ao invés de pedinte e barganhador?
- Por que não ser visto como engajado com o tratamento, ao invés de descompromissado?
- Por que não ser visto como protagonista da sua vida, ao invés de uma vítima das circunstâncias?
- Por que não ser visto como alguém corajoso e desejoso de se conhecer, ao invés de quem com síndrome de Gabriela?
- Por que não ser conhecido como alguém com garra, que vai a luta e é esforçado, ao invés de alguém acomodado e sem ânimo?
- Por que não ser conhecido como alguém proativo, ao invés de esperar tudo de “mão beijada”?
- Por que não ser visto como otimista e generoso, ao invés de pessimista e avarento?
- Por que não ser visto como alguém que caiu sim, mas se levantou, ao invés de um eterno prostrado?
- Por que não ser visto como alguém que sabe entrar e sair de todos os lugares com dignidade e cabeça erguida, ao invés de quem só arruma confusão?
- Por que não ser visto como alguém que cumpre a palavra, ao invés daquele que só faz promessas?
- Por que não ser visto como alguém que gosta e pega firme no trabalho, ao invés de um mandrião?
- Por que não ser visto como quem controla os impulsos e desejos, ao invés daquele entregue às paixões?
- Por que não ser visto como alguém com opinião própria, ao invés de ser Maria vai com as outras?
- Por que não ser visto como alguém que enfrenta os problemas, ao invés de terceirizá-los?
- Por que não ser visto como alguém em que se possa confiar, ao invés daquele que só deixa a desejar?
- Por que não ser visto como alguém que é perseverante, ao invés de inconstante, instável?
- Por que não ser visto como alguém que as pessoas querem estar juntas e que tem sempre algo de bom a passar, ao invés daquele que as pessoas querem longe, e só vê o lado negativo das coisas?
- Por que não ser visto como alguém que se importa com sua saúde mental, ao invés daquele que a negligencia?
- Por que não ser visto como alguém que é participativo e ajuda a construir, ao invés daquele que só critica, não faz nada e além de não fazer, destrói o que foi feito?
- Por que não ser visto como aqueles que foram no passeio e não aparentaram ter problema algum, ao invés de sempre reforçar seu lado ruim e que o problema é sempre maior?
- Por que não ser visto como alguém que aprende com as dificuldades e cresce, ao invés daquele que quer se mostra impenetrável e diz não ter jeito?
- Por que não ser visto como aquele que baixou sua guarda e pediu ajuda, ao invés daquele prepotente?
- Por que não ser visto como alguém que sim tem defeitos, mas é esforçado para mudança, ao invés daquele que tem defeitos e se vangloria deles?
- Por que não ser visto como alguém que só está passando por um momento difícil em sua vida, mas que vai passar como tudo um dia passa, ao invés de eternizar o problema e dormir abraçado com ele?
- Por que não ser visto como alguém que ama a vida e quer lutar para que ela seja melhor, ao invés de se autodestruir?
PERCEPÇÕES SOBRE O TRATAR SUPERANDO ESTIGMAS E VALORIZANDO O TRATAMENTO
São tantos os porquês listados acima, e devem existir mais centenas ou milhares deles. Ainda assim, acredito que ninguém tenha as respostas certas para todos e mesmo que alguém tenha alguma, a resposta que serve para um, não serve para o outro, por que o ser humano é complexo e a cada doente deve-se ter um olhar direcionado às suas individualidades e à completude de sua trajetória. E esses questionamentos não servem apenas para pessoas portadoras de transtornos mentais, mas sim para todos nós, em todas as esferas de relacionamento, sejam elas interpessoais ou corporativas.
Acredito que todas as pessoas têm dentro de si o senso de pertencimento, essa percepção de fazer parte de uma comunidade, de uma família, de um grupo, de uma nação e que em todos esses níveis de relacionamento, de alguma forma, buscará ser importante e notado de alguma maneira.
DESAFIOS FAMILIARES
Quando surge um problema de saúde mental em um seio familiar, tanto os familiares que não têm o direcionamento profissional nem a desmistificação da doença, quanto àquela família com o vasto conhecimento teórico e experiência por anos a fio sofrendo com o ente querido, pode ser um imenso empecilho para o bom resultado no tratamento. Vou explicar: O paciente e os familiares de primeira viagem tendem, na primeira fase, negar e minimizar a doença, dificultando o prognóstico. Quando a internação é indicada, isso acontece porque o paciente de alguma forma perdeu parcial ou totalmente a capacidade de autogerenciamento e vêm colocando a sua vida ou a de terceiros em risco. Os familiares ficam com o pé atrás, achando que não é necessário, mas, como foi indicado pelo médico de referência ou de um hospital geral, acabam acatando, muitas vezes à contra gosto, e, no intuito de amenizar o impacto e o sentimento de culpa, desenvolvem mutualmente acordos verbais antiterapêuticos, como “você ficará pouco tempo” ou “se não gostar é só falar que vamos buscá-lo”. O paciente por sua vez minimiza que não era para tanto e que poucos dias seriam o suficiente para a remissão dos sintomas.
Com esse tipo de postura do paciente e do familiar, as chances de sucesso nessa primeira internação são mínimas, necessitando outras intervenções posteriores.
Quando os familiares já estão calejados e estudaram sobre o tema (são “especialistas”), com inúmeras experiências negativas e várias tentativas de tratamento aos seus modos sem sucesso, a tendência é ficarem cansados, desesperançosos e acharem que não tem mais jeito, projetando tudo como defeito de caráter, sem-vergonhice e vagabundice, tentando anular a doença e acreditando que o trabalho das instituições é ineficaz. Mas, o que os familiares menos conseguem enxergar é que desde o início da problemática, ou mesmo anteriormente a ela, eles manejaram tudo de forma equivocada, achando que estavam fazendo a coisa certa. Começaram lá atrás com a negação, a superproteção, o preciosismo, não deixando o paciente concluir as etapas necessárias ao tratamento, tendo dó, não ouvindo os especialistas, cedendo às manipulações.
Depois de tanta angústia e aflição, tanto o doente quanto os familiares estão sofrendo e o que resta é a incredulidade em ambos os lados. Tantas idas, vindas e tentativas frustradas que a crença da família é a mesma do paciente, onde realmente “não tem jeito”. Um sentimento de fracasso, onde as internações só servem para dar um tempo de respiro para ambos e saírem um pouco da zona de risco. Nesta simbiose maluca o que permanece firme e forte são os comportamentos autodestrutivos, arraigados, desenvolvidos ao longo do tempo e reforçados pela imaturidade e ganhos secundários, os quais o fazem ser notado de alguma forma, e conseguem atrair a atenção de todos a sua volta, mesmo que seja de forma enviesada. Este ciclo vicioso, doentio e retroalimentado é quase impossível de ser penetrado, a não ser, acredito eu, por um processo que possa romper a estrutura e voltar novamente ao início, no senso de pertencimento, de aceitação, de se sentir importante, de ter um modelo, uma referência, pois os modelos e referências familiares já não servem mais, estão falidos por tanto desgaste.
PERCEPÇÕES SOBRE O TRATAR: A IMPORTÂNCIA DA ABERTURA PARA O TRATAMENTO
Enquanto o paciente e os familiares não se abrirem verdadeiramente para o tratamento, quanto mais o tempo passar, mais serão necessárias as múltiplas internações para conter os momentos de crise, contudo sem atingirem a efetividade e sucesso no tratamento. O paciente só desfruta do seu tratamento caso se permita envolver de forma adequada nele, pois estar internado não necessariamente é sinônimo de estar em tratamento.
O tratamento consiste no paciente entrar em um estado de ação, onde faça tudo o que for possível e necessário para seu autoconhecimento. É um movimento constante para a mudança no seu estilo de vida, uma quebra de paradigmas, o amadurecimento emocional, o desenvolvimento de habilidades interiores para lidar com situações de crise e estresse, e muitas outras ferramentas úteis que ele aprenderá a manusear no período em que estiver mergulhado na convivência dessa microssociedade plural em que está inserido.
HUMANIZANDO O TRATAMENTO EM SAÚDE MENTAL
Aí é que entra o profissional e o trabalho da equipe, com foco nas individualidades do paciente, procurando desenvolver a empatia e consequentemente, o vínculo terapêutico, deixando claro o que se espera de ambas as partes, sem julgamentos, sem estigmas e rótulos.
Olhando apenas para o ser humano que está sofrendo, o profissional deve se preocupar e demonstrar sua preocupação, gastar tempo, falar a mesma linguagem entre os membros da equipe (algo fundamental), ser assertivo, mas com afeto nas abordagens; deve ser técnico, mas também um bom ouvido; deve estar consciente que precisa tocar o paciente no seu âmago e por fora também (afago); deve mostrar o seu lado positivo e desafiá-lo a ser visto pelas pessoas por esse lado; deve ganhar o paciente e não deixar para depois, se ele te procura, olhe-o nos olhos e o acolha, pois a hora do paciente é diferente da nossa. O profissional tem que ter discernimento quanto a isso, trazê-lo para perto é a maior missão da equipe. Por isso, surpreenda-o, pegue-o no contrapé, eleve sua autoestima, garanta um ambiente harmonioso, ajude-o a entrar em ação e trabalhe todos os dias com intencionalidade focada nas metas do paciente, ajude-o a amadurecer, a superar as crises, a evitar críticas desnecessárias; aponte o caminho, lance desafios, ajude a atingir os objetivos, demonstre que você acredita nele e que você está com ele, que ele tem potencial para mudar, não desista dele e não o deixe desistir. Use de todas as ferramentas à sua disposição e, se estabelecer um vínculo com o paciente, você conseguirá.
O TRATAMENTO CONTINUA LÁ FORA
Quando há adesão à proposta terapêutica oferecida, abre-se um portal de oportunidades, e uma das mais importantes é a que o paciente tem o tempo e o privilégio de passar a se conhecer melhor, se questionar melhor e obter melhor respostas acerca de si mesmo. Sempre digo que quem não faz pergunta não tem resposta, e a maioria das respostas estão dentro de nós mesmos, inclusive o encontro com a própria luz, que aos poucos pode ir dissipando a escuridão que aflige a alma, basta nós nos perguntarmos.
Virão acertos e erros, e o melhor de tudo é que existe uma retaguarda terapêutica e farmacológica, um ambiente seguro, propício para estímulos de relacionamentos saudáveis e práticas de novos comportamentos. Uma nova esperança surge e mostra que nem tudo está perdido. Esse barco passará por inúmeras tempestades, mas é como se diz: o mar revolto é que faz bons marinheiros, mas com certeza também passará por águas tranquilas e ancorará em um porto seguro.
Clever Francisco Campos – Coordenador Terapêutico e Enfermeiro Responsável
HOSPITAIS ESTÂNCIA
O Hospitais Estância é o maior grupo do Brasil dedicado ao atendimento biopsicossocial com foco na saúde mental, seguindo padrões rigorosos da Anvisa e legislação específica. A matriz Estância Morro Grande (São Paulo), foi fundada em 2003, mas hoje, está presente em quatro unidades federativas e no Distrito Federal. Especializada no tratamento de distúrbios psiquiátricos, dependências e alcoolismo, conta com equipe multidisciplinar qualificada. Destaca-se pelo tratamento humanizado, integrando métodos terapêuticos imersivos, ressocialização e conduta medicamentosa em um espaço familiar e acolhedor. Oferece comunicação contínua com médicos psiquiatras e familiares durante a internação.
SOBRE O HOSPITAL ESTÂNCIA MORRO GRANDE
Com a localização privilegiada em Ibiúna, interior de São Paulo, iniciar sua jornada no Estância Morro Grande é simples, basta entrar em contato conosco através dos canais telefônicos e WhatsApp. Nossa equipe terá prazer em fornecer todas as informações necessárias, orientá-lo e responder a quaisquer dúvidas em sua jornada.
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